Capítulo 01
ORE COMO UM GOURMET – David Brazzeal
CAPÍTULO 1
ESTIMULANDO O SEU APETITE
“Fiz minha primeira refeição francesa e nunca vou me esquecer dela. Foi simplesmente maravilhosa. Comemos ostras e um maravilhoso vinho branco seco. Depois comemos um daqueles pratos salpicados com aquele maravilhoso molho cremoso amanteigado. Então comemos um pato assado e nem sei mais o quê.” – Julia Child, Larry King Live, CNN Transmitido em 21/08/2004, transcrição
Venha comigo para o coração de Paris. Um amigo próximo nos convidou hoje para um jantar. Promete ser um evento particularmente delicioso. Vou seguir minha lista de sempre de coisas a fazer para essa noite especial:
- Verificar hora da chegada: 20h00 ✅
- Comprar flores no mercado de rua ✅
- Localizar o apartamento pelo GPS ✅
- Determinar a melhor rota do metrô ✅
- Vestir-me bem ✅
- Partir para o soireé: 19h30 ✅
No metrô, já começa a dar água na boca só de imaginar as “possibilités culinaires” a caminho.
(20h30) A noite inicia-se com um “apéro” (aperitivo) e bebidas. Um vinho doce, proveniente da região de nossos anfitriões na França, é servido com salsicha seca e patê.
(21h00) Todos à mesa. Uma salada colorida é a primeira a aparecer na mesa, quase o suficiente para uma refeição inteira. Mas calma… lembre-se que tem mais por vir.
(21h30) A salada é seguida por um simples “soupe” ou “purée”. E, é claro, um “baguette”. Tudo isso seguido de uma pausa longa na comida para aprofundar a conversa… uma pausa longa o suficiente para fazer com que os mais inexperientes pensem que a refeição já acabou.
(22h30) O “pièce de résistance” (prato principal) faz sua aparição acompanhado por um ou dois pratos de vegetais. “Boeuf bourguignon” talvez. “Confit de canard”. Há um vinho para o prato, é claro, e uma fatia de “foie gras” ao lado.
(23H20) Uma tábua com um número de queijos aparece: talvez um “Camembert”, um “Comté”, um “Cantal”, um pouco de “chèvre” (queijo de cabra) e um “Roquefort”. Com outro “baguette”. Outro vinho.
(23h50) A sobremesa é servida e apreciada: “Crème brulée peut-être” ou “Mousse au chocolate”?
(00h10) Pedem-se os cafés. Tomarei um pequeno espresso. Já que está tarde, você prefere “déca” (descafeinado)?
LES POSSIBILITÉS
Desde que me mudei para a França, experimentei uma maravilhosa mudança no sentido da frase: “Gostaríamos de convidá-lo para uma refeição em nossa casa.” Esse sentido se expandiu. Se alargou. Aumentou em qualidade, gosto, cheiro, aparência… e eu estou adorando!
Mesmo se você não mora em Paris, para a maioria de nós nos países desenvolvidos no mundo, comer se tornou uma experiência potencialmente deslumbrante. Nunca antes na história tivemos acesso a tal variedade de comidas, nem às suas mais variadas formas de preparo. Há uma aparente infinidade de lugares onde podemos ter acesso a isso e inúmeros gêneros de entretenimento associados ao seu consumo. As escolhas são absolutamente impressionantes—alimentos de todos os cantos do globo terrestre, versões fusion de quase tudo, programas de culinária, ou melhor, redes inteiras de televisão dedicadas à culinária, sites de busca de receitas online, revistas de alimentos gourmet, restaurantes temáticos para toda a família, férias com alimentos exóticos em veleiros, infindáveis resenhas e recomendações de usuários, fóruns e salas de bate-papo sobre culinária. Além disso, há numerosos movimentos alimentícios globais: fair trade, orgânico, slow, local, vegetariano e vegano, kosher e halal, só pra identificarmos alguns.
Ainda assim, a despeito destes recursos nunca antes vistos no mundo da culinária, muitas pessoas, mesmo em países desenvolvidos, ainda vivem com dietas desinteressantes, sem variedade e sem riqueza.
TRÊS PEQUENAS HISTÓRIAS
História no 1:
Após participar de uma conferência de inverno em Alberta, peguei uma carona de volta pra Calgary com um professor amigo meu e sua esposa. Antes de sairmos da região montanhosa, eles perguntaram se eu estaria a fim de dar uma paradinha para um almoço rápido no Wendy’s (uma rede de fast food norte-americana).
—Tranquilo. Parece legal.— foi minha resposta. Como já passava do meio-dia, a maioria dos esquiadores já estavam nas encostas. As filas estavam curtas. Meus amigos pareciam saber o que queriam pedir, e eu também.
—Você sempre pede essa salada?— a esposa de meu amigo me perguntou.
—Não. É a primeira vez… pensei em provar uma salada diferente.— eu respondi.
Meu amigo exclamou com uma risada: —Você é TÃO inusitado… Gosto disso em você!
—Como é? O que há de tão inusitado com isso?”
—Bem, nós temos o hábito de comer no Wendy’s todos os dias na hora do almoço.— a esposa confessou, tímida. —E… sempre pedimos a mesma coisa.
História no 2:
Minha esposa e eu estávamos tirando uma folguinha prolongada para ficarmos próximos a duas de nossas filhas em Savannah, Georgia. A cidade é conhecida por seus carvalhos enormes cobertos por musgo espanhol e casas históricas de antes da guerra civil americana, e sobretudo por sua culinária sulista. Estávamos lá tempo suficiente para descobrir alguns excelentes restaurantes locais para recomendar, quando um amigo nos contactou, avisando que estaria passando pela cidade.
—Ei, Dave, vamos passar por Savannah a caminho da Florida pra férias com a família. Talvez podemos marcar pra comermos juntos? Vi na Internet que tem um Golden Corral (rede de restaurantes de rodízio) em Savannah. Nossa família ama esses bufês baratos onde comemos à vontade. O que você acha?
—Hummm… não seria minha primeira (nem segunda, nem terceira) escolha, mas tudo bem, se é o que você gosta.
História no 3:
Em Montreal, Québec, eu tenho um amigo artista de revistas em quadrinhos – provavelmente o amigo mais maluco que eu já tive. (Sim, você, Paul.) Em quase todas as áreas da vida, ele é aventureiro, imprevisível e extravagante. As roupas dele são extremamente coloridas. Quando ele entra numa sala com amigos, ele geralmente entrará com os braços levantados e alguma espécie de grito. O mundo dos quadrinhos que ele criou é quase tão real para ele quanto a minha pessoa. Ele é maluco, exceto quando se trata de comida. Ele come exclusivamente hambúrgueres, cachorros- quentes, batata frita e pizza com apenas uma rara (e muito relutante) exceção quando ele é convidado por alguém.
Uma noite, numa festa, Paul confessou: —Ei, pessoal! Tô com um problemão. Meus sogros me mandaram 50 dólares e mandaram eu ir a algum lugar legal pra comer com minha esposa.
—Mas por que isso seria um problema?— muitos de nós perguntamos ao mesmo tempo.
—Bem, os lugares em que eu gosto de comer, cês sabem, né? É só pizza e cachorro-quente. Não tem como eu gastar essa grana toda nestes lugares, sendo só nós dois. 1
Estas histórias lhe soam familiares? Se não sobre comida na sua vida, talvez lhe lembrem de sua dieta espiritual? Há algo em seu espírito que fica te dizendo que as coisas deveriam ser diferentes: mais interessantes, mais atraentes, mais criativas, mais profundas? Na sua vida de oração parece que você está comendo a mesma comida todos os dias—misturando os mesmos ingredientes mas esperando um prato novo, mais convidativo?
Ou talvez sua experiência parece mais com um drive-thru divino. Você rapidamente faz seu pedido de sempre, sempre com pressa, esperando que Deus entregue rapidamente na próxima janela?
Talvez seus momentos mais íntimos com Deus se pareçam com aquele prato congelado, guardado no freezer, jogado no micro-ondas: brando, monótono e previsivelmente desinteressante.
Eu entendo. Já passei por isso também. Todos nós lidamos com as pressões, estresse, distrações e falta de tempo do século 21. Somos vítimas do modo padrão de nossa cultura—rápida e eficiente. Nós até permitimos que o que George Ritzer chama de a “McDonaldização”2 da nossa sociedade invada e tome raiz dentro do relacionamento mais precioso para nós—aquele que, de fato, é a fonte que sustenta e nutre nossa alma. Não é pra menos que sentimos que estamos espiritualmente anêmicos e malnutridos.
Em círculos culinários ao redor do mundo, muitas pessoas estão reagindo, voltando a passar tempo descascando, picando e cozinhando alimentos locais, fazendo isso à sua maneira, com seu próprio tempero. Nós também podemos reagir e nos engajar em procurar alimento autêntico, calmo e refrescante para nossas almas—cada um de nós, é claro, com nosso próprio tempero.
Espero que este livro ajude a mover sua vida espiritual nesta direção, que ajude você a redefinir “oração” da mesma forma que morar na França mudou minha definição de comer. Que sua paleta de oração possa se expandir para que a sua alma se acostume a novos gostos e texturas. Que este livro te convide à aventura de se tornar mestre de receitas exóticas antigas de reinos inexplorados da cozinha espiritual. Que você aprenda a alegria de alimentar sua alma com criatividade. Em outras palavras, te convido a orar como um gourmet!

